A polêmica em torno da devolução, pelos professores temporários, do
dinheiro que o governo estadual lhes pagou a mais é bizarro, uma
anormalidade, considerando-se que um dos maiores problemas da precária
educação brasileira está justamente na carência de professores do ensino
fundamental. Pesquisas já feitas sobre a vocação das nossas crianças
mostram essa realidade com crueza. Perguntadas sobre o que desejam ser
quando crescerem, raríssimas delas respondem que pretendem seguir a
carreira do magistério. Mas se referem, na verdade, à condição de
professor universitário.
Essa é a verdade. Entre meninas e meninos do Brasil dos últimos anos,
ninguém pensa em alfabetizar, em ensinar aritmética, e é essa uma das
maiores falhas – se não a maior – da educação brasileira. Cabe às
autoridades conscientes dar todo estímulo à carreira de professor do
ensino fundamental, para que nosso país se livre do lamentável, mas
verdadeiro, registro de que mais de metade dos nossos alunos do terceiro
ano não entendem o que leem. Conhecem as letras, sabem formar a
sílabas, são capazes de repetir em voz alta o que está escrito na lousa,
no caderno, mas não entendem.
Num momento em que a economia brasileira cresce como uma das maiores
do mundo, ficando à frente até do Reino Unido pela medida do PIB
(Produto Interno Bruto), é essencial reforçar o ensino básico. O mundo
criou expectativas em relação ao que pode produzir a economia
brasileira, mas não vamos corresponder a tal expectativa com uma legião
de analfabetos fundamentais que, além do mais, não dominam as quatro
operações da aritmética. Precisamos dramaticamente de professores do
ensino fundamental.
Precisamos de professores motivados por condições de trabalho
favoráveis, por remuneração que desperte a atenção dos melhores, por
ideais que mantenham acesa a chama da vontade de participar de maneira
decisiva para o crescimento do país, para a consolidação do Brasil como
grande potência ainda na primeira metade do século 21, como já foi
previsto por economistas internacionais sérios. O bom professor do
ensino fundamental tornou-se, sem dúvida, um artigo de primeira
necessidade para o Brasil.
Não é essa, entretanto, a percepção das nossas autoridades. Existe,
nessa polêmica sobre devolver dinheiro pago a mais, uma questão básica,
elementar: se é dinheiro público, não pode ficar no bolso desse ou
daquele indivíduo. Mas, quando esse indivíduo é um professor, cabe às
autoridades buscar soluções mais nobres. Não poderiam permitir que
tivéssemos chegado a esse ponto de o professor ter de descontar um
décimo de sua remuneração, até reembolsar o tesouro estadual, como
estava previsto até a Apeoesp conseguir uma liminar cancelando a
cobrança.
Por: Diário de S. Paulo, 21/01/2012
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